
As confissões de Rodrigo Janot poderia ser nome de livro. Mas, na verdade, as inconfidências do ex-procurador-geral da República desnudam ainda mais um sistema que, por não ter controle, pode se tornar nocivo.
O Ministério Público (MP) surgiu como o conhecemos hoje na Assembleia Nacional Constituinte de 1987-1988. A intenção era criar um sistema persecutório independente. Cabe aos procuradores acusar. Já ao Judiciário é reservado o julgamento.
- Covid-19: Brasil passa das 210 mil mortes causadas pela pandemia
- Pelotas receberá 12.400 doses da coronavac
- O mapa do contágio pela covid em Pelotas
- Dr. Cloroquina admite que medicamento não reduz mortes
- Censo Funcional e Previdenciário já pode ser respondido
O Executivo deve fornecer os meios de investigação e punição – por meio das polícias e de fiscais. No começo de tudo, está o Legislativo que tem a prerrogativa de decidir o que é crime. Aparentemente, trata-se de uma engrenagem onde nenhuma instância atua sozinha. O conhecido checks and balances estaria garantido. Mas eis que não.
Procuradores e promotores agem sem controle. E quem não tem controle, descontrolado fica.
Quarto poder
Primeiro, é preciso perceber que, informalmente, o Ministério Público transformou-se num quarto poder já que, na prática, são plenamente independentes. Basta ver suas prerrogativas.
Procuradores estão no topo da pirâmide salarial brasileira. Trabalham se e quando quiserem, pois ninguém deles pode cobrar produtividade. Caso cometam um delito grave são punidos com a aposentadoria compulsória – assim como os magistrados. Estas regalias, inalcançáveis para os demais brasileiros, não constituem o aspecto mais grave da instituição.
Esta casta abastada e apartada dos brasileiros comuns tem poderes ilimitados sobre os investigados. Um procurador pode deliberar quando e quem acusar. Pode sentar indefinidamente sobre uma investigação. Pode decidir que um caso mais novo tem prioridade sobre um mais antigo.
Com salários incompatíveis para um país cuja renda média é de R$ 2.286, de acordo com o IBGE, os abastados membros do Ministério Público apartam-se dos demais. A ponto de um procurador de Minas Gerais considerar um salário-miserê os R$ 68 mil mensais percebidos em 2019 – considerados os indefectíveis penduricalhos.
Diante das estapafúrdias declarações de Rodrigo Janot, comento aqui apenas o caso dos procuradores. Mas juízes não perdem em nada no quesito de moralidade pública. Ou da falta dela. Quem controla o controlador?
Quem controla o controlador?
Sobressaem, assim, duas conclusões importantes.
Primeiro, a de que o presidente Jair Bolsonaro acertou em não ceder ao lobby da casta do MP. Indicar o procurador-geral da República (PGR) é prerrogativa presidencial assegurada na Constituição. Seguir a lista tríplice indicada pelos procuradores seria encastelar ainda mais a categoria hiperpoderosa. Augusto Aras, o novo PGR, integra a casta, mas não faz parte da panelinha de procuradores que se entende dona do MP.
Segundo, o Congresso Nacional cumpriu seu papel ao votar a Lei do Abuso de Autoridade. Acertou, também, talvez por outras motivações, ao derrubar parte dos vetos presidenciais. Não são os juízes e procuradores quem têm que se defender da cidadania que lhes paga os gordos vencimentos. Somos nós, cidadãos, os que sustentam com impostos todo o sistema público, que precisamos de meios que nos protejam das arbitrariedades de todo o funcionalismo.
Autoridade tem que ser exemplo
A Operação Lava-Jato estabeleceu um marco na história do Brasil. Com ela, pela primeira vez na nossa história, poderosos ricos e brancos amargam a vida atrás das grades por terem roubado dinheiro público. Entretanto, sistemas que não podem ser fiscalizados tendem à arbitrariedade. Atualmente, juízes e procuradores trabalham num mundo à parte, sem controle. É preciso integrá-los ao convívio dos demais cidadãos.
Para tanto, a categoria não pode ficar imune às investigações fiscais (Receita Federal, Coaf) e policiais (Polícia Federal, Polícia Civil). Ao contrário, como responsáveis por fazer justiça, devem todos ser fiscalizados com maior rigor, já que o exemplo deve vir das autoridades.
Se não faz nenhum sentido que parlamentares disponham de foro privilegiado, tampouco juízes e procuradores devem tê-lo. A incontinência verbal de Janot fez soar mais um alerta contra o mal do poder sem controle e sem fiscalização.
Não se pleiteia que o MP pare de investigar e denunciar, mas que seus membros sejam submetidos ao mesmo rigor dos demais cidadãos. * Foi CEO da Falconi, presidente do Banrisul, secretário de Planejamento do RS e candidato ao governo gaúcho.