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Opinião

A prefeitura, a crise e os sapatos do outro

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Condenar um político é fácil. Faz parte do pacote. Uma má notícia pode apagar tudo de bom que um gestor fez e faz. De repente, sente-se como Coringa, só e incompreendido, sujeito ao linchamento social. Não deve ser agradável, mas, como dito, faz parte do pacote.

Não devemos linchar o gestor, mas ao menos temos a obrigação de reclamar seus limites, humanos e contábeis.

Sobre a crise financeira da prefeitura, que começou a atrasar salários, a prefeita diz que avisa desde 2017 que o Município teria problemas de caixa à frente. Deduz-se que nada havia que pudesse fazer.

Avisou que o problema chegaria. E chegou. Mesmo assim, algumas coisas poderia ter feito, se os métodos do governo não fossem convencionais.

Poderia ter colocado em pauta a ‘transferência do Colégio Pelotense’ para o governo do estado. Ensino Médio, como o prestado pelo CP, é atribuição estadual. Por tradição, Pelotas arca com os custos de um compromisso de outro.

Poderia ter privatizado a Administração da Rodoviária, único terminal gaúcho gerido pelo Município. Nossa sofrível Rodoviária, porém, continua a ser o que sempre foi, um lugar aonde acomodar filiados de partidos que apoiam o governo, hoje PP e PSB.

Poderia ter demitido os cargos de confiança; senão todos, grande parte. Mas os ccs também servem para alojar apoiadores políticos.

Igualmente, poderia ter trabalhado pela transferência dos serviços do Sanep à iniciativa privada, em regime de concessão. A prefeita chegou a dizer que a universalização do saneamento, via PPP, era seu sonho, mas desistiu dele. Sobre o Sanep, vale acrescentar: em vez de cortar ccs da autarquia de águas, fez passar na Câmara um projeto criando 17 novos ccs, ao custo de R$ 1 milhão por ano.

No âmbito da moralização pública, o governo municipal poderia ter proposto uma lei prevendo quarentena para funcionários de confiança que, após deixarem o governo, ingressam em empresas privadas que se utilizaram de seus serviços quando eram agentes públicos. A ideia, que chegou a ser aventada por um vereador, foi esquecida. Hoje chega a ocorrer uma duplicidade funcional na mistura de interesse público e privado, com funcionário do governo assinando licenças para empreendimentos aos quais, como particular, presta serviços.

O governo atual tem qualidades? Tem. Mas, humano, tem defeitos também. Entre eles, é um governo que não se faz notar pela modernização da estrutura do poder público. Ao contrário, conserva velhas fórmulas, como a de manter o poder ao preço da competência profissional, loteando cargos, terceirizando a administração aos consultores, adiando soluções estruturais, enquanto, de outro lado, faz campanhas de comunicação destinadas, por exemplo, a nos estimular a manter a cidade limpa. Na verdade, nem faz mais essa campanha.

A nova campanha propaga que “ninguém sabe o que é calçar os sapatos do outro”. À primeira vista é uma peça de solidariedade aos servidores do Sanep que desentopem nossos canos. Mas pode ser interpretada, subliminarmente, como um pedido oficial de perdão. Como se devêssemos calçar os sapatos do governo para entendê-lo.

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Cultura e entretenimento

Anatomia de uma queda, o vencedor da Palma de Ouro. Por Déborah Schmidt

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 Samuel (Samuel Theis) é encontrado morto na neve do lado de fora do chalé isolado onde morava com sua esposa Sandra (Sandra Hüller), uma escritora alemã, e seu filho Daniel (Milo Machado Graner), de 11 anos, com deficiência visual. A investigação conclui se tratar de uma “morte suspeita”, pois é impossível saber ao certo se ele tirou a própria vida ou se foi assassinado. Sandra é indiciada e acompanhamos seu julgamento que expõe o relacionamento do casal. Entre o julgamento e a vida familiar, as dúvidas pesam sobre a relação da mãe com seu filho.

Com um começo instigante, Anatomia de uma Queda coloca dúvidas na cabeça do espectador: Samuel caiu acidentalmente do chalé ou cometeu suicídio? Ou será que foi empurrado por Sandra? Ao longo de 2h e meia, o filme desenvolve sua narrativa sem pressa e de forma complexa, focada nos diálogos. A primeira parte explora a investigação e a reconstituição da morte de Samuel, enquanto que na segunda temos o julgamento, com Sandra suspeita e acusada do assassinato do marido, tendo que provar sua inocência com ajuda de Maître Vincent Renzi (Swann Arlaud).

A diretora Justine Triet acerta em cheio ao trabalhar com diferentes versões, sem nunca apresentar uma verdade definitiva e nem respostas prontas. O roteiro de Triet e Arthur Harari, seu marido na vida real, foi uma colaboração perfeita ao explorar a intimidade do casal e a relação, muitas vezes abusiva, entre eles.

Em uma das grandes atuações do ano, Sandra Hüller tem uma performance poderosa. Falando em inglês, com dificuldade em francês e sem poder falar em sua língua materna, ela passa por todas as nuances de sua personagem e, ao lado do jovem Milo Machado Graner, conferem à narrativa uma profundidade impressionante.

Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes e forte candidato ao Oscar, Anatomia de uma Queda é um angustiante estudo de personagens que desvenda as complexidades das relações humanas.

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Opinião

Sistema público está anárquico

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O sistema público brasileiro está anárquico. Exemplos próximos confirmam isso. No último dia de outubro passado, a prefeita Paula Mascarenhas avisou, na véspera do pagamento dos salários aos servidores, que iria atrasá-lo, por falta de recursos em caixa. Ela pretendia pagar o salário de outubro a 28% dos funcionários em dois momentos: no final de novembro a uma parte deles e, no final de dezembro, à outra parte.

A justiça reagiu com liminar, determinando o pagamento em 72 horas e a prefeita acabou pagando, usando para isso – como socorro – dinheiro do Sanep e do fundo previdenciário dos servidores, o Prevpel, e agora conta com o pagamento de IPTU para saldar os salários de novembro, dezembro e 13º. Por lei ela precisa fechar o ano tendo devolvido o que pegou do Sanep e do Prevpel, outra dificuldade.

Além disso, só neste novembro a prefeita foi revelar que fechará o exercício de 2023 com um déficit no ano de R$ 110 milhões, um déficit acumulado desde o começo do ano, mas que estranhamente ficou oculto, sem que um Plano de Contingência tivesse sido elaborado lá atrás para enfrentar a crise.

Mais: a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), enviada há pouco pelo Executivo para votação na Câmara, prevê um déficit de R$ 282 milhões no orçamento de 2024 do município, quase o triplo do verificado neste ano.

A prefeitura está quebrada.

Já Eduardo Leite, governador do RS, disse nesta semana que pretende aumentar o ICMS de 17% para 19,5%, uma paulada no custo de vida, já que a elevação do imposto resulta no aumento dos preços das mercadorias. Foi uma desagradável surpresa, já que, na campanha eleitoral, Leite avisou: “Pode confiar, não aumentaremos impostos”.

Por sua vez, ontem, o deputado federal Daniel Trzeciak anunciou que obteve meio milhão em emendas para custear uma festa de Reveillón no Laranjal. A legislação não permite redirecionar verbas carimbadas de um setor para atender prioridades em outro setor, uma situação, porém, que leva a pensar, pelo quadro relatado, que precisaria ser repensada.

Ainda assim, creio que é questionável a destinação daquela alta quantia para o fim que terá: pagar um show da banda de pagode carioca Revelação e a estrutura de apoio à festa. R$ 500 mil que, em grande parte nem ficará em Pelotas, será levado pela banda carioca.

Entre outras possibilidades, poderiam ter decidido gastar aquele meio milhão para promover, por exemplo, mais de um festival anual de teatro escolar, com prêmios, envolvendo alunos e professores. Seria algo bom para as escolas. Quantos talentos não poderiam surgir? Mesmo que não surgissem, os festivais integrariam a comunidade, os alunos, seus pais, as famílias, como ocorre com o Jepel, os jogos esportivos municipais, que aglutinam a comunidade e são um aprendizado para os estudantes, que ganham, perdem, vivem emoções.

Com aquela verba, seria possível fimanciar alguns festivais anuais de teatro ou de música, algo verdadeiramente útil, em vez torrar aquele dinheiro num show de duas horas, meio milhão literalmente posto fora, sem trazer ganhos culturais duradouros à sociedade.

Os fatos reunidos neste artigo mostram que, além de um descontrole financeiro nas contas públicas, está faltando planejamento e foco nas prioridades. Será que as pessoas estão mesmo interessadas em festa de Reveillón? Não estarão com a cabeça em outro lugar, em outras prioridades? As pessoas devem ficar baratinadas com a falta de coordenação dos nossos representantes.

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