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Cultura e entretenimento

Palavras exclusivamente de Pelotas (2). Por Luiz Carlos Marques Pinheiro

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Conheci Luiz Carlos Marques Pinheiro há uns 10 anos. Ele me disse que escrevia crônicas sobre Pelotas, memórias do tempo que viveu aqui. Na época, já há quase 50 anos morando em São Paulo capital, ele não esquecia Pelotas, para aqui sempre viajava para rever parentes e mergulhar na atmosfera da cidade. Amava sua terra Natal. Nesta semana, um primo dele, Francisco de Paula Marques Rodrigues, me contou que Luiz havia falecido e deixara um acervo de crônicas sobre a cidade – que ele, Francisco, considerava que merecia ser mais amplamente divulgado. Interessei-me em publicar, o que, com autorização de Francisco e das filhas de Luiz, farei semanalmente, uma crônica por vez. (RSA)

Luiz Carlos e esposa,
Luiz Carlos e a esposa, Suzana

Luiz Carlos Marques Pinheiro (*)

Indiscutivelmente, Pelotas fala uma linguagem própria, singular. São palavras de uso corrente, que não constam nos melhores dicionários brasileiros. Constituem um belo desafio para a área de Linguística das universidades pelotenses.

Nota da redação: Abaixo, 25 da mais de uma centena de palavras identificadas por Luiz Carlos. Ao longo deste fevereiro, postaremos outros lotes de palavras até totalizá-las. Links para demais lotes no final deste post.

Segue Luiz Carlos:

Rafoagem = grupo de pessoas de baixo nível, bagunceiras

Em Pelotas dá-se o nome de “rafoa” a quem faz rafoagem: sujeito rafoa.

“Não dá mais pra brincar no Carnaval de rua. É só rafoagem!

Carro de praça = taxi

Ao que tudo indica, se deve ao fato de que os taxis, em Pelotas antigo, faziam “ponto” somente nas praças públicas.

“Pra ir pro aeroporto tem que ser de carro de praça; não existe outra condução!”

Se pisar = machucar-se

“Olha, tu fica correndo de moto como um louco; depois tu te pisas, não vai te queixar!”

Se fresquear = assumir postura delicada, “não me toque”

“Olha! Não começa a te fresquear que eu chuto a tua bunda”.

Murrinha = guri chato

A origem do termo está na palavra “morrinha”, que é um cheiro forte e desagradável exalado por animal ou pessoa,que adere ao tecido ou a pele. O guri “murrinha” adere às pessoas da mesma forma.

“Mas que guri murrinha! Enquanto a gente não dá uma moeda ele não pára de pedir!”

Estefe = reserva

Caldas Aulete registra a palavra “estepe”: sm. 1. Pneu reserva de veículos terrestres [F.: Prov. do ing. step, ou spare tire ‘pneu sobressalente’.]

“Ele não é o goleiro titular; ele é o estefe.”

Tri-bom = muito bom, excelente

É um neologismo local; também se usa tri-legal.

Salamito (de Caxias) = salame tipo italiano

“Pra fazer um tira-gosto não tem nada melhor do que o salamito de Caxias, com um
pouquinho de limão.”

Altos e baixos= sobrado

Na realidade, a palavra descreve o aspecto físico de um sobrado.

“Coloquei à venda uma linda casa, de altos e baixos, construção recente, face norte. Acho que vendo logo”.

Camiseta-de-física = camiseta-regata

Refere-se a uma camiseta utilizada para a prática da Educação Física.

“Esses halterofilistas gostam de usar camiseta-de-física pra poder mostrar os músculos. Cérebro, nenhum!”

Cabelo melado = cabelo louro de mulher, amarelado

“Eu até gosto das louras, mas não daquelas de cabelo melado”.

Coberta de mesa = aparelho de jantar; um conjunto de louças

Uma coberta de mesa inglesa, clássica, tinha 24 pratos rasos, 12 pratos fundos, 12 pratos de sobremesa, 12 xícaras consomé, 1 sopeira com tampa, 2 legumeiras com tampa, 1 molheira, 5 travessas de tamanhos diferentes, 3 pratos redondos (com presentoir), 2 travessas fundas (terrinas).

A minha coberta de mesa inglesa eu só uso em ocasiões muito especiais, como no
Natal, por exemplo
“.

Máquina de flit = pulverizador de inseticida

“Flit” é o nome de um inseticida. O produto original foi criado e desenvolvido em 1923 pela Standard OilCompanyof New Jersey com o objetivo de matar mosquitos.

“Meu filho, traz aqui a máquina de flit, que eu vou tocar nesses mosquitos. Hoje está
impossível!”
.

Pula-pula = moto-taxi

A palavra descreve os movimentos do corpo de quem vai na garupa da moto.

“Meu filho, dá 5 pila pra Derô pegar o pula-pula”.

Facão = mau motorista

“Eu não ando de carro com aquele sujeito nem que a vaca tussa. É um baita facão!)”

Avião = muito esperto

“Aquele cara é um avião. Você tem que estar sempre se cuidando. Não dá pra fazer
negócio com ele”.

Atirador = bodoque, estilingue

“Aqui no Parque não pode entrar com atirador. É proibido matar passarinho”.

Fubecada = invertida, entortada

“Tomei uma fubecada que me deixou meio sem rumo. Fui ser gentil com uma guria
e o namorado dela me encheu de porrada”.

Essência (de café) = extrato

Pra fazer um bom café preto precisa, primeiro, tirar uma essência bem forte;
depois, se coloca um pouco de essência na xicrinha, e depois se coloca água
fervendo) Que horror!!!

Zoiúdo = olhos interesseiros

“O descarado vendedor daquela loja olha os peitos da gente de uma maneira que a gente se sente nua. Zoiúdo!”

Chicote (do ferro) = fio do ferro elétrico

Também é chamado de “rabicho”.

“Meu filho, eu quero usar o ferro elétrico e não encontro o chicote. Procura pra
mim!”
.

Carioquinha= cafezinho

“Tu aceita tomar um carioquinha? Foi passado na hora!”

Estrupício=menino inútil (xingamento)

“Mulher de vila, para o filho menor: sai daqui estrupício!”

Galocha = carro grande e velho

Só tem registro no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa como substantivo.

No final da década de 50 (1958), a Ford tinha um modelo enorme, conversível, considerado já superado: 1958_Ford_Fairlane_Convertible_RWZ199.

“O Márcio gosta de desfilar em roda da praça, aos domingos, com aquela galocha (ou banheira) velha, só pra se exibir!”

Biguano = colono humilde

“Presta atenção! Aqueles biguanos, quando vêm à cidade, andam em fila na rua, um atrás do outro; todos de alpargata e boina”.

Lote 1

(*) Luiz Carlos Marques Pinheiro nasceu em Pelotas, em 12/01/1940, onde estudou nos colégios São Francisco e Pelotense. Em 1961, foi trabalhar em São Paulo, onde se casou alguns anos depois com Suzana do Couto Rosa Pinheiro, tendo duas filhas: Beatriz e Izabel (na foto, com o pai). Formou-se em Direito na Faculdade São Francisco, desempenhando atividades profissionais em várias empresas, destacando-se o Banco Bandeirantes, onde foi diretor de marketing. Faleceu em São Paulo, em 16/12/2021. Embora morando há 60 anos fora, ele adorava Pelotas e tinha um blog sobre a cidade.

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Cultura e entretenimento

Luiz Carlos Freitas lança novo romance: Confissões de um cadáver adiado

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O escritor e jornalista Luiz Carlos Freitas autografa na próxima quinta-feira (30), a partir das 18, na Livraria Mundial, seu novo romance: Confissões de um cadáver adiado. Freitas mergulhou no trabalho durante um ano até bater o ponto final.

O romance tem como ponto de partida e chegada a própria vida do autor, que sobreviveu a uma sentença que parecia de morte.

O prefácio fala por si:

Realidade e ficção na hora da morte Amém!

Sou filho do povo pobre e escravizado, a literatura me libertou e salvou. Perambulei por aqui e ali, encontrei guarida, força e sobrevivência financeira no jornalismo, oásis e alegria no ofício de escrever romances de cunho social, em paralelo, nas horas roubadas ao lazer e ao convívio familiar. Escrever me bastava, ser famoso e ganhar dinheiro não me atraia – expulsar fantasmas íntimos era o objetivo. Até que, no final de abril de 2011, ocorreu o que eu previa desde quando perdi meu pai, em 1973, aos 43 anos, vitimado por câncer no estômago e metástase no fígado.

Eu trabalhava na conclusão do romance MoriMundo e, em função de desconforto gástrico, fui me consultar. Desconfiança do médico, endoscopia, diagnóstico de enfermidade anunciada: tumor maligno de 2,5 cm (a mesma doença paterna) no Piloro (parte do estômago). Solução? Cirurgia. Pra ontem! Fui operado dia 13 de maio de 2011. Tudo certo! Extraíram o tumor e parte do estômago – deram-me como curado. Milagrosamente. Sem metástases. Tirei o prêmio da Mega Sena. Hurras! Vivas! Safei-me. Em julho dispensei o auxílio-saúde do INSS, voltei ao trabalho e à conclusão do MoriMundo, com a responsa de retornar a consultar-me com o oncologista em novembro, já com a tomografia em mãos.

Terminei o livro e o publiquei em setembro daquele ano. Ufa! Em novembro fiz a “Tomo” e me apresentei ao médico, pacificado, tranquilo, sem nada a temer. Choque! De alta voltagem! O cara leu o laudo do exame e me disse na lata: Problemas! Novo tumor no estômago, outro no pâncreas, um terceiro no baço e necrose no fígado. Puta… Balancei. No pâncreas! Tremi, me senti mal, meu mundo caiu, pensei: É o fim, prezado Freitas. Deu pra ti, camarada! O que temia há 40 anos se tornou realidade. Dei um tempo. Recuperei-me. E perguntei ao oncologista: Quanto tempo de vida? Entre seis meses e dois anos! Respondeu na hora, insensível e habituado às dores alheias. O que devo fazer? Extirpar os tumores por meio de cirurgia, a fim, talvez, de prolongar a vida, respondeu: Tchau e benção!

Dei entrada ao hospital dia 1º de janeiro de 2012, com cirurgia marcada para a manhã seguinte. No íntimo se digladiavam a esperança, a desesperança, o medo e um vago sentimento de aceitação do inevitável. Fiquei novehoras na mesa de cirurgia. Extraíram o tumor e o que restava do estômago, a cauda e a cabeça do pâncreas, o baço, e rasparam a necrose do fígado. Acordei e percebi que continuava no mundo dos vivos. Por pouco tempo. Deu rolo. Intercorrências nas cirurgias. Abriram-me mais cinco vezes consecutivas e instalaram um dreno no fígado para filtrar o excesso de bílis. Fui indo, dois, três dias… Bactéria estava à toa na vida e decidiu infectar-me.

Peguei infecção hospitalar das bravas. Dê-lhe litros de antibiótico e parará. A coisa piorou, choque séptico, falência de órgãos múltiplos… Adeus mundo! Quinze dias em coma! Caixão e sepultura prontos, família conformada, médicos nem aí para mais um caso perdido (aqui é força de expressão, “licença poética”). Acordei! Vi três rostos em forma de santa – não lembro a ordem: minha mãe, minha companheira, minha irmã caçula. Acordei do coma para espanto geral – milagre! –, permaneci três meses no hospital, perdi 30 quilos, voltei pra casa – milagre! A enfermidade foi superada, estou limpo  há 11 anos e 25 dias, completados hoje, 26 de setembro de 2023. Não tenho estômago, partes do pâncreas, o baço, a vesícula, a aparência e a energia de outrora…

Nesses quase 12 anos de recuperação física e mental, ganhei sobrevida, 15 quilos (meu peso oscila entre 52 e 55 Kg), paz, tranquilidade, tempo para escrever, certa lucidez, aposentadoria por invalidez, uma coluna política três vezes por semana no centenário Diário Popular (desde 2014 até dezembro de 2020), e uma vida praticamente normal – sem sequelas graves. Ainda que sobre mim paire a sombra do medo da recidiva. Entre 2014 e 2015 escrevi o romance Homo Perturbatus, publicado em 2016, reeditei Amáveis inimigos íntimos, em 2017, Odeio muito tudo isso, em 2019, e publiquei o romance Ninguém em 2020. Enquanto isso, Confissões de um cadáver adiado maturava na mente e no espírito, à minha revelia, esperando o momento certo para vir à luz. Comecei a escrevê-lo em maio de 2022, após necessária visita à aldeia Campelo, no Norte de Portugal, onde nasceram meus avôs paternos. Concluí a obra em março de 2023. Foi doloroso reabrir velhas feridas, descobrir outras, furtivas. Às vezes, chorava e lamentava meus erros, geralmente a melancolia, a nostalgia e a culpa ditaram o ritmo e as palavras. Fui em frente!

Confissões de um cadáver adiado não é um manual de superação da enfermidade – longe disso. Mas é testemunho inequívoco de que o diagnóstico de câncer – mesmo os considerados irremediáveis – já não é sinônimo de finitude. Tampouco tem a pretensão de “colonizar” o outro, como diz Saramago. O objetivo da obra é compartilhar experiências, plantar esperança, mostrar a ambiguidade, a imperfeição e a mesquinhez do ser. Há outros. Diversos.  Descubra-os!

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Cultura e entretenimento

Anatomia de uma queda, o vencedor da Palma de Ouro. Por Déborah Schmidt

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 Samuel (Samuel Theis) é encontrado morto na neve do lado de fora do chalé isolado onde morava com sua esposa Sandra (Sandra Hüller), uma escritora alemã, e seu filho Daniel (Milo Machado Graner), de 11 anos, com deficiência visual. A investigação conclui se tratar de uma “morte suspeita”, pois é impossível saber ao certo se ele tirou a própria vida ou se foi assassinado. Sandra é indiciada e acompanhamos seu julgamento que expõe o relacionamento do casal. Entre o julgamento e a vida familiar, as dúvidas pesam sobre a relação da mãe com seu filho.

Com um começo instigante, Anatomia de uma Queda coloca dúvidas na cabeça do espectador: Samuel caiu acidentalmente do chalé ou cometeu suicídio? Ou será que foi empurrado por Sandra? Ao longo de 2h e meia, o filme desenvolve sua narrativa sem pressa e de forma complexa, focada nos diálogos. A primeira parte explora a investigação e a reconstituição da morte de Samuel, enquanto que na segunda temos o julgamento, com Sandra suspeita e acusada do assassinato do marido, tendo que provar sua inocência com ajuda de Maître Vincent Renzi (Swann Arlaud).

A diretora Justine Triet acerta em cheio ao trabalhar com diferentes versões, sem nunca apresentar uma verdade definitiva e nem respostas prontas. O roteiro de Triet e Arthur Harari, seu marido na vida real, foi uma colaboração perfeita ao explorar a intimidade do casal e a relação, muitas vezes abusiva, entre eles.

Em uma das grandes atuações do ano, Sandra Hüller tem uma performance poderosa. Falando em inglês, com dificuldade em francês e sem poder falar em sua língua materna, ela passa por todas as nuances de sua personagem e, ao lado do jovem Milo Machado Graner, conferem à narrativa uma profundidade impressionante.

Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes e forte candidato ao Oscar, Anatomia de uma Queda é um angustiante estudo de personagens que desvenda as complexidades das relações humanas.

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