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Opinião

Direto com a dona. Por Montserrat Martins

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Maria decidiu resolver o problema: foi falar diretamente com a nova mulher do seu ex-marido, para resolver o tratamento dispensado às duas filhas quando visitavam o pai, a madrasta e a nova irmã delas, do novo casamento. Foi uma conversa com todo mundo junto, Maria, as duas filhas, ex-marido, nova mulher e filha, tudo isso na casa da nova companheira.

A conversa começou tensa, é óbvio. O ex-marido parecia assustado. A nova mulher, tensa. Maria, determinada, foi direto ao ponto: estava ali para que suas filhas tivessem o mesmo tratamento do pai que a nova filha tinha, quando das visitas ao pai, e para que ficasse claro que ela não queria o ex de volta, que uma coisa não tinha nada a ver com a outra: existe ex casal, mas não existe ex pai. E disse mais, hoje existe uma nova criança, com o pai em casa, vai que amanhã não esteja, ele vai deixar de cumprir as suas obrigações de pai?

João, então, tentou falar grosso com a ex, mas foi desautorizado pela atual. A anfitriã, mesmo tensa, pareceu ter assimilado o recado, pois a ex deixou bem claro seu desinteresse pelo homem, fora lá cobrar o papel de pai. E que amanhã (quem sabe dizer?) poderia ser a situação da ex, lutar pela sua filha ser bem tratada pelo pai.

Com João “enquadrado”, tendo de se expressar com respeito, a conversa então foi evoluindo, ficando bem claro que não se tratava do passado, mas do futuro. O homem não estava sendo disputado pelas duas mulheres, pelo contrário, passou a ser cobrado pelas duas em suas responsabilidades.

Maria encontrou a solução, falando “direto com a dona”, nesse tipo de drama repetido, que vejo sempre no meu trabalho, quando me pedem avaliações psiquiátricas de partes em conflito nas Varas de Família ou da Infância e da Juventude. Na grande maioria dos casos não há nenhum transtorno psiquiátrico nessas pessoas, o transtorno que está por trás de suas brigas ferozes são de emoções humanas muito básicas, a começar por ciúmes e insegurança.

Nossa cultura machista tem como característica homens “falando grosso” com a ex-mulher e obedientes à nova companheira, com a qual não querem se incomodar. É um padrão de comportamento repetitivo, que chega a chamar a atenção quando não segue esse padrão, quando há madrastas não ciumentas ou inseguras com os filhos da ex. (O mesmo vale também para padrastos ciumentos).

Do machismo aparente, para a sociedade ver, dentro de casa esses “valentões” são tão submissos à nova mulher que chegam a abandonar filhos por medo dos ciúmes da nova companheira. Maria intuiu isso perfeitamente, por isso foi falar “direto com a dona”, com quem ela entendeu que estava influenciando o pai de suas filhas.

Maria me contou sua história sem ter sido orientada por nenhum médico, nenhuma psicóloga, nem por assistente social. Foi sua intuição, observação, reflexão, capacidade de análise e sabedoria que a fizeram encontrar essa solução. Não estava dando certo falar com o ex, ele não lhe escutava, ela decidiu então falar com quem tinha poder de decisão, com a nova “dona” dele.

Claro que podia ter dado errado, mas sua clareza de pensamento, sua sinceridade de intenções, fizeram com que a outra a compreendesse e confiasse nela. Não é uma receita de bolo, que cada uma possa fazer em casa sem riscos. Mas é um caminho excelente para quem souber fazer assim, ir falar direto com a “dona”.

Esse tipo de cultura primitiva, onde homens são colocados contra seus filhos pelas atuais mulheres, traz um enorme prejuízo para toda a sociedade. Crianças e jovens rejeitados crescerão inseguros, depressivos, ou revoltados, conflitivos, expandindo seus sofrimentos familiares em suas relações sociais. É um padrão de comportamento muito, muito repetitivo mesmo, é ainda o padrão dominante numa sociedade que deveria ser mais civilizado. Por isso mesmo, “temos de falar sobre isso”. Obrigado pelo exemplo, Maria.

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Brasil e mundo

Hora de os governos se abrirem à participação colaborativa da sociedade

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Quando houve as manifestações populares de 2013 no Brasil, por melhores serviços públicos, virou corrente na época o entendimento de que os políticos já não davam conta, sozinhos, dos problemas da sociedade, cada vez mais complexos. De que era preciso uma abertura para a participação da sociedade, inclusive nas decisões de governo.

Nas enchentes, agora, temos visto a importância dos voluntários. Sem eles os governos teriam maiores dificuldades para lidar com os problemas. Li que, em Pelotas, um grupo de pessoas teve a ideia de refazer a ponte da Z3 com recursos privados. A ideia foi levada nesta segunda (20) à prefeitura, que, a princípio, acolheu a proposta de que a ponte seja refeita, não mais de madeira, mas sim de concreto, como pretendem os autores da ideia.

Tragédias podem servir para que governos repensem a forma de gerir a coisa pública, abrindo-se à participação popular, formando uma rede colaborativa. Por que não? Abaixo, outro exemplo. Ainda mais significativo. Primeiro, a dificuldade. Depois, a solução.

Mãe de um menino com autismo, uma amiga me contou que o Município não possui profissionais nas escolas para atender especificamente crianças com o transtorno. Diante disso, ela propôs contratar por conta própria um profissional para dar atenção ao filho nos serviços que a municipalidade não cobre, com a atenção individual que esses casos requerem.

A prefeitura, porém, recusou, alegando a impossibilidade de admitir a presença de um profissional privado em ambiente público. Pode ser. Mas, diante de uma demanda que o Município não consegue atender, seria o caso de adequar à realidade. Não é algo intransponível.

Em São Paulo, o governo estadual liberou a presença de atendente pessoal dentro das escolas estaduais para alunos com deficiência, pago pela família do estudante com recursos próprios, por plano de saúde ou do SUS. O Decreto n° 68.415, de 2 de abril de 2024, permite que atendentes pessoais possam acompanhar o estudante no ambiente escolar. O atendente pode ser um familiar do aluno ou um profissional contratado pela família.

Novos tempos, novos problemas, exigem novos entendimentos.

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Opinião

Ainda sobre a bomba e o duto do Lagos de São Gonçalo

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Certamente foi o tempo. Passei a gostar da palavra Equilíbrio e de seu significado. Nesta crise das enchentes, o trabalho voluntário tem sido admirável, comovente. Mas estamos vendo que o Estado tem sua importância também.

Além dos voluntários, em Pelotas o poder público tem agido e merece esse reconhecimento, não só com a prefeitura, a Universidade Federal e as forças de segurança, mas também com o Ministério Público. O caso do condomínio Lagos de São Gonçalo parece um bom exemplo – simbólico.

Fosse um regime totalmente liberal, com estado mínimo e a sociedade determinando seus rumos por si mesma, aquela lamentável bomba e aquele lamentável duto destinados a canalizar a água de dentro do condomínio de alto padrão para fora de seus muros, em prejuízo de comunidades mais carentes economicamente, talvez passasse como algo aceitável.

Não seria aceitável, porém. Não é aceitável.

O Estado agiu rápido, tomando providências.

A prefeitura informou que não deu autorização para a obra, que, construída à revelia do Estado, infringiu a lei ambiental, além de ferir preceitos de ordem moral e de convivência desejados numa sociedade civilizada.

A polícia registrou a ocorrência e está apurando o caso. E as conclusões da investigação servirão de base para que – como adiantou a Promotoria de Justiça – esta processe os autores da ideia da bomba e do duto.

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