Já esquecendo todas as peripécias eletrônicas da Dona Maricota e suas intromissões inoportunas nas postagens de Facebook, o que fez com que considerássemos como Papagaio de Pirata eletrônico, resolvi dedicar-me à leitura e releitura de meus livros em minha pequena biblioteca.
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Neiff
Estava escolhendo o primeiro livro, quando ouvi uma voz de dentro de uma das estantes. Gelei, pois a voz parecia conhecida. Cada livro que pegava a voz lia algumas citações. Pronto! Dona Maricota estava invadindo minha biblioteca- “melhor do que se continuasse a invadir alguma Rede Social da Internet”.
Imaginei o que aconteceria se pegasse um livro qualquer, o que ela diria, que escolha faria de um assunto ou frase.
Dona Maricota me surpreendeu, toda esta caminhada por um mundo que ainda desconhecemos serviu de aprendizado. Dona Maricota foi escolher exatamente o livro com a 1ª edição datada de 1884–SELETA EM PROSA E VERSO, de Alfredo Clemente Pinto – A edição que tenho é de 1980 (55ª Edição).
Quando estava retirando o livro, um pouco surpreso, um pouco assustado, este saltou de minhas mãos e foi parar no chão, abriu-se na página 171 e a voz da Dona Maricota começou a ler pausadamente:
“A peste (era o subtítulo). A razão por que tenho pelo mais desgraçado de todos os males é a peste, é porque nas outras enfermidades o maior benefício que vos pode fazer quem vos ama, é estar convosco; na peste, a maior consolação que vos pode dar quem mais amais, é fugir de vós. Mal em que o dizer: ’estai comigo’ é querer mal, e dizer: ‘fugi de mim’ é querer bem. Grande mal! Se a peste não fora enfermidade mortal, só por isso matara.”
Após esta leitura, silenciou… tive a sensação dever seus olhos misturados as linhas, olhos tristes.
O próximo livro já não foi minha escolha, simplesmente saltou sobre minhas mãos. Era A PEDAGOGIA NA ESCOLA DAS DIFERENÇAS – fragmentos de uma sociologia do fracasso, de Philippe Perrenoud de 2007.
Dona Maricota continuava me surpreendendo. Abriu-se na página 60 e ela, sem não antes dar um sorriso maroto, iniciou a leitura de uma pequena frase: “Atualmente, o debate sobre a cultura deveria ser indissociável de um debate sobre a pedagogia. O elitismo depende destes dois eixos, se existir vontade política, a pedagogia é capaz de se transformar mais que a própria essência da cultura escolar”.
Este livro já ficou na bancada, vou relê-lo. Esta Dona Maricota está me dando um trabalho danado, mas sabe escolher temas dentro do contexto atual, Fiquei pensando: “realmente ensinar, dar conta da gestão na educação, é coisa para profissionais, do ensino, é claro”, sendo mais claro, “para os professores”!
Durante meia hora, mais ou menos, reinou silêncio na biblioteca. Achei que a Dona Maricota tinha se recolhido a um lugar qualquer, mas não foi bem assim, alguns livros começaram a se mexer de forma meio desorganizada e um deles, de capa azul, caiu sobre a mesa do computador, tratava-se do O MÉTODO 5 – A HUMANIDADE DA HUMANIDADE, A IDENTIDADE HUMANA de Edgar Morin…. Lentamente foi, misteriosamente, sendo folhado por dedos invisíveis. até chegar à página 268, aí a voz inconfundível da Dona Maricota se fez ouvir, sempre com aquele sorrisinho maroto: “A liberdade só pode ser exercida numa situação que comporte, ao mesmo tempo, ordem e desordem; é preciso, de fato um mínimo de estabilidade e de regularidade, ou seja, de certezas a priori para escolher e decidir; e um mínimo de desordem e de risco, de incertezas a priori para elaborar uma estratégia. Excesso de ordem impede a liberdade; excesso de desordem, a aniquila. De fato, é esse coquetel natural de ordem/desordem/organização, que torna materialmente possível a liberdade”.
Pô! Dona Maricota, porque lançar na nossa cara tudo isso. A gente já estava pensando que as coisas estavam normalizando, agora vamos ter que digerir estas informações/conhecimentos!?
Ela leu meus pensamentos! Só pode ser, pois imediatamente atirou quase todos os livros no chão, deu uma gargalhada e… sumiu.
Já estou até com medo, mas ao mesmo tempo curioso, do que vem por aí. Dona Maricota com todo o tempo livre que tem, anda aprendendo muito nestes tempos de Pandemia…
Neiff Satte Alam é professor Universitário Aposentado – UFPEL Biólogo e Especialista em Informática na Educação
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