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Cultura e entretenimento

A lição das borboletas

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Dentro da cápsula por ela mesma produzida, em um meio translúcido onde as cores do mundo são filtradas, mas a luz consegue penetrar e aquecer aquele ser que se prepara para uma metamorfose total. Espremendo-se, contorcendo-se, totalmente transformada, a borboleta se desfaz do invólucro que foi sua morada temporária e cúmplice de sua metamorfose e, esticando totalmente as asas, reina sobre a vegetação que a alimentou, enquanto larva, na maioria das vezes muito feia e perigosa e agora se enfeita com suas cores que a fazem brilhar sobre os diferentes ângulos da luz solar.

Este novo nascimento, agora borboleta, coloca-a em um mundo nem sempre amistoso. Terá que lutar contra os outros da mesma espécie para realizar a procriação. Terá que se proteger dos predadores que, atraídos por suas cores que contrastam com o meio, devoram-na sem dar importância para sua beleza. Mesmo neste mundo competitivo, muitas conseguem reproduzir e, deixando descendência, cumprem com seu papel de manter em harmonia o meio em que existem.

Nós não somos diferentes. Prontas para a primeira aventura, espremendo-se pelos condutos genitais e buscando a luz, nascem para a vida intrafamiliar as crianças que, absolutamente dependentes, ultrapassam, rastejando, engatinhando e finalmente caminhando, a primeira barreira extra-uterina. Protegidas, alimentadas, muito amadas, encaminham-se para o segundo nascimento – a saída do casulo familiar. Adolescem, nascem para o grupo social, preparam-se para os primeiros e importantes ensinamentos de como vencer a concorrência com os demais e, principalmente, vencer os conflitos internos, inseguranças e heranças atávicas, isto é, vencer a luta travada dentro de si.

Este nascimento para a sociedade, tal como acontece com as borboletas, está cheio de imprevistos, de desafios, de combates duros com a realidade que teima, em muitos casos, em não ser a desejada, mas a que se apresenta como única alternativa viável. A partir daí as coisas acontecem de forma diferente, pois mais que um simples instinto, que domina totalmente as borboletas, temos algo que deve ser trabalhado pela nossa mente privilegiada: “a capacidade de dar significado às informações que apreendemos”, mesmo as instintivas, fazendo delas os meios de alcançarmos nossos objetivos de vida. Ficamos, então, adultos.

As borboletas, a não ser pelo instinto, desligam-se das etapas anteriores, mas nós não. O homem cultua sua história de vida, pode reconstruir seu passado para qualificar seu presente e aventurar-se por caminhos mais de acordo com sua natureza e que o inclua no universo em que vive podendo, inclusive, modificar este universo, qualificando o meio para si e para os que estão ainda saindo dos “casulos” familiares, permitindo, ainda, que as borboletas possam seguir saindo de seus invólucros protetores e embelezando os jardins e bosques, competindo com as flores, alimentando seus predadores como forma de sacrifício ao equilíbrio da natureza e ensinando-nos que a vida não é uma circunstância de um único ser, mas é o equilíbrio entre todos os seres vivos.

1 Comment

1 Comments

  1. Radamés Padilha

    12/06/20 at 07:45

    Texto muito bem escrito;; parabéns !! temos que aprender com as borboletas !!!!

Cultura e entretenimento

Furiosa: uma saga Mad Max. Por Déborah Schmidt

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Considerado por muitos (na qual me incluo) o melhor filme de ação do século XXI, o excepcional Mad Max: Estrada da Fúria finalmente ganha sua aguardada sequência quase uma década depois de seu lançamento. Furiosa: Uma Saga Mad Max é um prequel de Furiosa, onde retornamos às origens da heroína interpretada anteriormente por Charlize Theron.

Novamente dirigido por George Miller, a história segue a jovem Furiosa (Anya Taylor-Joy), sequestrada de seu lar pela gangue de motoqueiros liderada por Dementus (Chris Hemsworth). Logo eles alcançam a Cidadela, dominada por Immortan Joe (Lachy Hulme). Enquanto os dois tiranos disputam o domínio, Furiosa se vê envolvida em uma batalha incessante para retornar ao seu lar.

Nas primeiras cenas do filme vemos a traumática infância da protagonista (vivida por Alyla Browne). Muito antes de chegar à fase jovem, ela passa por todo tipo de sofrimento, sempre calada e totalmente sem saída. A partir dessa premissa, o longa realiza um verdadeiro estudo da futura imperatriz, que precisa se adaptar perante a escassez de uma terra desolada.

George Miller, que também assina o roteiro ao lado de Nick Lathouris, aproveita para expandir o universo de Mad Max, visto que a trilogia original iniciou no final dos anos 1970. Desde então, o australiano narra a derrocada do que sobrou do mundo, o desmanche da sociedade e os indivíduos recorrendo a atos de barbárie para sobreviver, utilizando veículos como máquinas de destruição. A produção acerta ao dividir a trama em capítulos, e a sensação é de que estamos assistindo uma verdadeira odisseia.

O conflito entre Furiosa e Dementus é o grande destaque do filme. Com Anya Taylor-Joy dominando a tela com uma atuação de poucas palavras, densa e absolutamente concentrada no olhar, a atriz também impressiona nas sequências de ação, porém não possui o mesmo carisma de Charlize Theron. Contando com um ótimo trabalho de maquiagem da vencedora do Oscar Lesley Vanderwalt, Chris Hemsworth surge como um vilão exagerado, caótico e levemente cômico.

Com uma fotografia de Simon Duggan menos marcante do que a de John Seale em Estrada da Fúria, a uma trilha sonora do holandês Tom Holkenborg, mais conhecido como Junkie XL, aposta na desordem de uma história grandiosa, ao melhor estilo Mad Max, em perseguições explosivas e cheias de adrenalina.

Mesmo que inferior ao seu antecessor, Furiosa: Uma Saga Mad Max é um filme poderoso. O longa oferece uma visão mais profunda do universo de Mad Max, explorando os desafios enfrentados por uma protagonista arrebatadora. A espera realmente valeu a pena.

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O charme do outono. Por Geraldo Hasse

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Esse tempo chuvoso me transportou automaticamente para a salinha do teletipo nos fundos da redação do Diário Popular. Eu cursava o terceiro ano noturno de jornalismo e ganhava um salário vespertino para traduzir telegramas que chegavam em espanhol via Agência France Presse (AFP). Também pela mesma máquina vinham notícias da Agência JB, mas essas não era preciso traduzir, vinham em português de boa qualidade (na época, o Jornal do Brasil era um modelo de jornalismo, atividade hoje subalterna ao marketing).

O teletipo foi a atração daquele ano no jornal, que se considerava portador de uma revolução redentora dos costumes da região. Às vezes um dirigente da empresa aparecia na salinha rebocando um visitante supostamente interessado em conhecer o aparelho mágico. Eu, mero coadjuvante, nem sempre chegava a ser apresentado. Era um mero acessório da máquina, o zé ninguém da redação. Mas quem municiava o jornal com o noticiário nacional e internacional? Era eu e ninguém mais.

O teletipo passou o ano inteiro cuspindo principalmente reportagens sobre a guerra do Vietnã; certo dia, trouxe a notícia da morte em estranho acidente aéreo no Ceará do marechal Castello Branco, o primeiro chefão do governo militar; semanas depois, morria fuzilado na selva boliviana o revolucionário argentino Che Guevara. E eu ali na solidão da salinha 3 x 4 vivendo e aprendendo sobre a marcha da civilização.

Nos intervalos daquele matraquear incessante, eu lia os grandes poetas brasileiros editados pela Editora do Autor e me animava a escrever versos que nunca foram publicados mas ainda não desapareceram da minha memória (lá vai):

“Eu te ofereço meus ternos versos,

são o presente mais puro que te dou:

são beijos em minha boca imersos,

sobras do banquete que acabou”.

O que deveria ser um soneto não passou de uma quadrinha. Faltava não apenas inspiração, mas tempo para ir além do trivial. Fora o tactac do noticiário, havia as distrações do ambiente. O céu cinzento, a umidade impregnando paredes e os telhados gotejando a chuva intermitente me desviavam para cenas inesperadas.

Lembro que através da vidraça da janela eu via numa árvore já sem folhas — um cinamomo, provavelmente — algumas pombas encolhidas sob a chuva: pareciam “corvos de cinema” (estávamos ainda sob o impacto do filme Os Pássaros, no qual a pobrezinha da Tippi Hedren, indefesa, era atacada sem motivo aparente por bandos de aves negras amestradas pelo terrorista Alfredo Hitchcook).

Por tudo isso, senhoras e senhores, o outono, mesmo com chuva, continua encantador. Em Pelotas e em outras latitudes.

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